06/04/2010

reportagem

A verdadeira origem do sanduíche Bauru

A partir de entrevista do jornalista Luciano Dias Pires com o político/médico que inspirou a criação de Casimiro Pinto Neto, não foi difícil juntar as peças e descobrir que o legítimo Sanduíche Bauru não foi criado em 1934. Essa reportagem a quatro mãos foi publicada na edição 17 da 94FM Revista, do final de 2007, mas não ganhou o eco merecido. Uma descoberta histórica da qual me orgulho.

Clique nas imagens abaixo para visualizar em tamanho legível:






23/10/2009

no final de 2006

Mais Schumacher do que Senna



Terminada a entrevista coletiva em Botucatu, Felipe Massa, mais informalmente, ainda respondia a perguntas dos reporteres. Questionei-o sobre o GP Brasil 2006 vencido por ele e a inevitável lembrança de Ayrton Senna.

Apesar de ele ter afirmado coisa diferente à grande mídia tempos depois, eu tenho gravado o que ele me disse: não tem Ayrton Senna como ídolo, era muito garoto, não criou essa referência. Disse sem rodeios que o cara que o inspirou foi o companheiro Michael Schumacher - que pouco antes havia anunciado aposentadoria para, entre outros motivos, abrir espaço para Felipe.

22/10/2009

anos depois...


Fiz meu Trabalho de Conclusão de Curso (afaladabola) em 2002. Trabalho bem tranquilo, despretensioso, um livro-reportagem apenas a fim de experimentar formatos e discutir a mídia futebolística - com texto de revista e layout de jornal (texto em duas colunas em um página de 14 x 21cm!!!). E eis que seis anos depois o William Douglas, do jornal Bom Dia e também formado em Jornalismo na Unesp/Bauru, lembrou-se deste trabalho ao ver a dica do meu blog, homônimo, no meu tag do MSN. Comentou que a turma de boleiros que hoje estuda por lá confere a "obra" na biblioteca. Achei legal, pois imaginava que acumularia poeira.

Detalhe:
Neto é meu ídolo de infância (e nunca tinha visto a capa do livro Eterno Xodó (Renato Nalesso e Fabrício Bosio, Gryphus Editora), que tem a mesma imagem de capa. Coincidência total.

21/10/2009

flamengo 3 x 1 vasco (27/5/2001)

Mais uma estrela e... vice de novo!

Havia muita coisa em jogo naquela tarde de maio. Para o Vasco, a chance de livrar-se da sina de vice, pois não vencia os rubro-negros numa decisão desde 1988 - a goleada de 5 a 1 pela Taça Guanabara de 2000 foi válida pela última rodada do turno, que era disputado em pontos corridos, mesmo caso da Taça Rio de 1999. Para o Flamengo, a chance de bordar a quarta estrela na camisa (cada uma delas corresponde a um tri carioca - critério abandonado em 2004, quando ficou apenas a dourada do Mundial).

Some à atmosfera do Maracanã a vitória do Vasco na partida de ida, a ausência de Romário, contundido, o carisma de Zagallo, a falastrice de Eurico Miranda... Do lado flamenguista, Edílson, artilheiro do campeonato, e seu desafeto, Petkovic, o articulador das jogadas. Do lado vascaíno, a velocidade de Juninho Paulista e Euller e o oportunismo de Viola.

O Vasco começou melhor a partida e poderia ter confirmado o título não fossem duas importantes defesas de Júlio César. Primeiro, defendendo chute de Juninho, que arrancou do meio-campo driblando a defesa do Mengo. Depois, cara a cara com Viola, salvou com o pé esquerdo. A história começou a mudar quando Cássio recebeu de Beto na área e, ao cortar Clébson, levou a rasteira. Edílson converteu o pênalti. Juninho, porém, levou seu time tranquilo para o vestiário, ao empatar aos 40, completando jogada de raça de Viola, numa bola aparentemente perdida.

No intervalo, o Velho Lobo deve ter batido um papo com seu protetor, São Judas Tadeu.
Só pode ter sido o padroeiro das causas perdidas quem inspirou os inimigos íntimos a se entenderem em campo: Petkovic ciscou pela esquerda e cruzou na medida para o Capetinha completar de cabeça. Faltava um para o título, mas o Vasco se impôs. Novamente o santo agiu, soprando a cobrança de falta de Juninho - sempre ele - que parou no travessão. E, certamente, concedeu poderes celestiais a Júlio César, que operou milagre em finalização de Euller.

Mesmo próximo o fim do jogo, os vascaínos ainda não gritavam "É campeão" a plenos pulmões. A prudência ganhou sentido quando Edílson sofreu falta na intermediária. Praticamente do mesmo lugar em que Rodrigo Mendes fez o gol do título de 1999, o que sugeria um chute forte, talvez de Beto. Mas coube a Pet lembrar Zico, encobrir a barreira e colocar a bola no ângulo. Foi o décimo gol de falta dele com a camisa 10 rubro-negra. Hélton se esticou todo, mas, essa nem São Judas Tadeu pegaria.

FLAMENGO 3 x 1 VASCO
Maracanã, no Rio de Janeiro-RJ - Final do Campeonato Carioca 2001 - Árbitro: Léo Feldman - Público: 60.038 - Gols: 1ºT: Edílson (23), Juninho Paulista (40); 2ºT: Edílson (8), Petkovic (43).

Flamengo: Júlio César; Alessandro (Maurinho), Fernando, Juan e Cássio; Leandro Ávila, Rocha, Beto (Jorginho) e Petkovic; Reinaldo (Roma) e Edílson. Téc: Zagallo.
Vasco: Helton; Clébson, Odvan (Geder), Alexandre Torres e Jorginho Paulista; Paulo Miranda, Fabiano Eller, Pedrinho (Jorginho) e Juninho Paulista; Euller e Viola (Dedé). Téc: Joel Santana.

Depoimento: em entrevista ao colega Marcelo Ricciardi, Pet declarou que só se deu conta da importância do gol depois de algum tempo. "Até hoje aqueles momentos passam pela minha cabeça como se fosse um filme. Já joguei em outros clubes com torcedores fanáticos, mas a torcida do Flamengo foi além disso. Sei que todos eles terão sempre um carinho muito grande por mim."


Texto publicado na revista Tributo Esportivo Edição Histórica 6 (Foto: reprodução)

20/10/2009

botafogo 1 x 0 flamengo (21/6/1989)

Esta noite nunca vai terminar

O Botafogo chegou invicto à finalíssima. Mas, curiosamente, sem vencer nenhum clássico. Só empates contra os maiores rivais. Aliás, não vencia Flamengo, Vasco ou Fluminense no Estadual há três anos. Era um sofrimento potencializado, um pão bem amassado pelos antideuses do futebol.

E por mais que o Fogão chegasse forte àquela partida, do outro lado havia um Flamengo cheio de estrelas, nomes de Seleção Brasileira: Jorginho, Aldair, Leonardo, Zico, Bebeto e Zinho, comandados por ninguém menos que Telê Santana. Nada que amedrontasse o raçudo Paulinho Criciúma, ícone de um time vibrante e brioso. Mas, foi um jogo sofrido, bem ao estilo alvinegro.

No primeiro tempo, o Glorioso não chutou a gol. Os rubro-negros chegaram com perigo, principalmente numa cabeçada de Bebeto que Ricardo Cruz foi buscar no ângulo. Veio o intervalo e o técnico Valdir Espinosa pediu raça aos jogadores, a um grupo de poucas estrelas, mas muita experiência, principalmente os selecionáveis Josimar e Mauro Galvão - um elenco montado a dedo pelo cartola Emil Pinheiro. Mais aplicado, o Fogão matou o jogo aos 12 minutos da etapa final. Luisinho deu ótimo passe em profundidade para Mazolinha, que substituíra Gustavo. O cruzamento encobriu Leonardo, que marcava Maurício. O ponta-direita só escorou e partiu alucinado para o afago da torcida. Vestindo a mítica camisa 7 alvinegra, Maurício teve lampejos de Garrincha. A certa altura, chamou Aílton e Zé Carlos II para dançar e centrou para Paulinho Criciúma cabecear no travessão. "Uhhhh!", ecoou a galera, lamentando o que seria o gol de seu maior ídolo, para sepultar de vez o Urubu. Depois, foi só administrar o nervosismo e aguardar o apito final, já que até o empate servia ao Glorioso.

Na geral, as lentes focavam a jovem Sonja, que ganhara fama em dezembro de 1988, quando, gandula, chorava copiosamente ao ver seu time de coração apanhar de 3 a 0 do Vasco. Aquelas lágrimas motivaram a todos no clube, que não perdeu nenhum jogo desde então até chegar ao título estadual. E como há certas coisas que só acontecem ao Botafogo, vale lembrar como o time chegou à decisão. Graças ao Vasco, algoz do ano anterior. Na última rodada da Taça Rio, bastava uma vitória sobre o Bangu, mas o 0 a 0 frustrou a todos e parecia ser mais um ano de espera, pois se o Flamengo vencesse os cruzmaltinos, ganharia os dois turnos e levaria o título por antecipação. Mas foi um ano tão mágico que o clube notoriamente azarado ganhou uma ajudinha e tanto para chegar àquela noite de 21 de junho e ganhar, com propridade, uma taça que estava escrita para ser sua.

Botafogo 1 x0 Flamengo

Final do Campeonato Carioca de 1989 - Maracanã, Rio de Janeiro-RJ - Árbitro: Walter Senra - Público: 56.412 - Gol: 2ºT: Maurício (12)
Botafogo: Ricardo Cruz; Josimar, Wilson Gottardo, Mauro Galvão e Marquinhos; Carlos Alberto Santos, Luisinho e Vítor; Maurício, Paulinho Criciúma e Gustavo (Mazolinha). Téc: Valdir Espinosa.
Flamengo: Zé Carlos; Jorginho, Aldair, Zé Carlos II e Leonardo; Aílton, Renato Carioca e Zico (Marquinhos); Alcindo (Sérgio Araújo), Bebeto e Zinho). Téc: Telê Santana.

Curiosidade:
Criaram-se tramas numerológicas para dar um ar místico ao título do supersticioso Botafogo. Uma delas eternizou, através de matéria do jornalista Renato Machado, da TV Globo, que as camisas de Mazolinha (14), que cruzou, e Maurício (7), o autor do gol, somavam 21 (lembrando o tempo de jejum e o dia da final). Forçação de barra: Mazolinha vestia a 16.

Depoimento: nosso entrevistado, o técnico Valdir Espinosa, revelou que o herói Maurício jogou com o tornozelo inchado durante todo o segundo tempo. Em seu depoimento, disse ainda que sua formação tática com dois pontas e um falso centroavante (Paulinho Criciúma) confundiu os adversários.

Texto publicado na revista Tributo Esportivo Edição Histórica 6 (tema 'Jogos Inesquecíveis'). Foto: reprodução site de O Globo

19/10/2009

futebol e cinema

Sobre 'O Milagre de Berna'

Fiquei muito curioso para ver o filme O Milagre de Berna após a crítica tecer inúmeros elogios, citando-o como uma das melhores reproduções de um jogo de futebol.

Realmente, a reconstituição da final da Copa de 1954, vencida pela Alemanha, impressionou. O húngaro Puskas ganhou um sósia e tanto. O irritante recurso de filmar canelas aparece pouco, mas os efeitos especiais não combinam com uma partida de meio século atrás. Em resumo, passa. Continuo recomendando.

Apesar de muitos verem exagero nacionalista, não vejo como ser diferente, pois aquele Mundial simbolizou o renascimento dos germânicos, destruídos pela guerra motivada por eles mesmos.

Entretanto, o verdadeiro milagre - o de haver um filme muito bem feito sobre futebol - já havia acontecido. Em 1998, Ugo Giorgetti dirigiu Boleiros: Era Uma Vez o Futebol. Sensacional.

Estava tudo lá: o boteco, a cerveja, os causos, a bola. Sem pieguice, foi fundo no maior drama do boleiro, que é parar de jogar. Os lances de jogo - que eu tanto sonho ver retratados com fidelidade no cinema (como é o futebol americano em Um Domingo Qualquer e Duelo de Titãs) - não são lá essas coisas, mas quem se importa? Boleiros tem o cheiro do gramado molhado, pois apela ao imaginário, como faz o próprio futebol.

A espera foi longa até a seqüência do filme, produzida em 2005. Ainda está lá o treinador turrão vivido por Lima Duarte, com seus palavrões italianados. Impecável. O melhor momento do longa.

Boleiros 2: Vencedores e Vencidos passa a sensação de estar faltando algo, mas é covardia comparar com o primeiro. E, com sobras, merece ser recomendado. Ainda mais se pensarmos em recentes produções brasileiras desastrosas.

Zico - O Filme tinha tudo para ser uma linda cinebiografia, pelo brilhantismo do herói em questão, mas judia do espectador. Dá a impressão de que quem fez entende pouco de futebol, ao priorizar a dramatização - com um ator perna de pau.

Em Garrincha - A Estrela Solitária, o único mérito está na impressionante caracterização de Taís Araújo como Elza Soares. Melhor ficar com o livro de Ruy Castro.

O erro nos filmes desses dois craques não se repetiu em Pelé Eterno. A estrela é o próprio Pelé - exceção feita à reconstituição do gol de placa do Maracanã e à sua infância em Bauru. Documentário bem feito, com roteiro de José Roberto Torero. Pena que Edson Arantes do Nascimento não é tão bom quanto Pelé. Entre outros problemas, o lançamento do filme foi adiado para ser omitido, na edição, o gol de Gérson na goleada sobre a Itália, na final da Copa de 1970. Tudo porque o Canhotinha havia criticado uma opinião de Pelé dias antes. Atitude pequena para um Rei.

Entre essas e outras, pelo menos o maior jogador de todos os tempos ficou eternizado. Todas as gerações poderão comprovar que não houve - nem haverá - alguém como ele dentro de campo.

O que há de comum entre os filmes nacionais sobre futebol? Bilheterias vazias. Como afirmei em outro artigo, brasileiro não consome futebol.


- - - - -
Exceto a atualização do primeiro parágrafo, o texto original foi publicado no site do jornalista Marcio ABC em setembro de 2007

o negro e o futebol

Princesa Isabel deu o pontapé inicial

Quando a princesa regente assinou a Lei Áurea, há quase 120 anos, amenizou (só amenizou) a injustiça sofrida pelos negros e ainda presenteou o mundo todo, pois, exatamente 70 anos depois, Pelé e Garrincha estavam livres para arrancar efusivos aplausos de milhares de branquelos nas arquibancadas suecas. Mas desde que Charles Miller trouxe a bola ao país, em 1894, até o triunfo de 1958, a vida dos negros não foi fácil – e continua difícil no intolerante século 21.

Praticado só pela burguesia em seus primeiros anos de atividade no Brasil, o “football” dos universitários engomados começou a se render aos trabalhadores das fábricas e também aos jovens negros ociosos das periferias, com muito tempo para desenvolver um “técnica sedutora”, como descreve Anatol Rosenfeld em Negro, Macumba e Futebol – o ensaísta alemão considerou o futebol sua porta de acesso à cultura brasileira.

Se por um lado os pobres e mulatos ganhavam regalias trabalhistas (como no time do Bangu, que nasceu em uma fábrica de tecidos e foi o primeiro a escalar negros) e status social (o Vasco da Gama foi o primeiro a ter pessoas de classe baixa entre seus sócios) em troca de seus dribles, a realidade fora dos 90 minutos de jogo continuava cruel. “O que valia no jogo não podia impor-se tão rapidamente na vida” (Rosenfeld).

Um atenuante para essa marginalização: o brilho do Diamante Negro, Leônidas da Silva, artilheiro da Copa do Mundo de 1938, abriu definitivamente o mercado do futebol (àquela época recém-profissionalizado) para os negros.

Como Mário Filho constata em O Negro e o Futebol Brasileiro, a culpa pela imperdoável derrota no Maracanã – que anos mais tarde ganharia o nome do jornalista – em 1950 recaiu sobre três negros do time: os defensores Bigode e Juvenal e, principalmente, o goleiro Barbosa.

Em 2006, às vésperas da Copa na Alemanha, o humorista e dublê de comentarista esportivo Chico Anysio teve a infelicidade de afirmar no diário Lance! que não tinha confiança em um goleiro negro, fazendo referência a Dida e lembrando-se do pobre Barbosa.

Dois exemplos de um incessante mar de intolerância, que infelizmente rende outras tantas dessas linhas e prova que o futebol, mesmo sendo um grande palco para os negros mostrarem seu valor, é apenas mais um espelho fiel da nossa sociedade.


- - - -
Texto publicado no site do jornalista Marcio ABC em maio de 2007

18/10/2009

fim dos estaduais

Trajano: "O Juca quer matar o Ameriquinha!"

Aproveitando a chegada dos Estaduais, resgato essa opinião do jornalista José Trajano. Em abril de 2007, fui a um evento organizado pela revista Caros Amigos, em que ele e Juca Kfouri bateram descontraído papo com o público. Quando chegou minha vez de perguntar, Juca já havia saído, pois tinha que correr para a rádio e apresentar, ao vivo, seu CBN Esporte Clube. Pedi então a opinião do Trajano sobre os Estaduais, tão combatidos pelo Juca. Argumentei que a razão de o clube pequeno existir é receber a visita do grande. Ele concordou e deu divertida resposta, que guardo gravada. Com a palavra, José Trajano:

"Nossa discordância [entre ele e Juca] é brutal. Já brigamos na televisão, inclusive ao vivo, várias vezes. O Juca defende uma tese que é exatamente oposta a isso [referindo-se ao meu argumento]e eu estou do outro lado. Talvez por ser torcedor do América [do Rio, hoje na Segunda Divisão] e entender bem esse tipo de problema que você falou, como torcedor do Noroeste. Eu acho que o campeonato estadual é nossa paixão primeira. É mais importante ver meu time ganhando do adversário local. Um amigo meu diz que se acabar o campeonato estadual, acaba a segunda-feira. Porque a graça da segunda para o corintiano, o são-paulino e palmeirense é passar pelo adversário no seu local de trabalho e poder tirar sarro daquele cara. Brincar com aquela pessoa."

"Com essas teses de acabar com os Estaduais, o times pequenos vão acabar. No fundo, o Juca e quem mais defende o calendário sem o Estadual querem assassinar esses times. O Juca quer matar o Ameriquinha! O Juca quer fuzilar o Noroeste! Eles querem que permaneça quem tem competência, quem for grande. Mas que grande é esse que tem competência? Corinthians tem competência?" [risos - à época, havia o imbróglio com a MSI]

"Então, eu acho que os campeonatos estaduais têm que continuar, são a paixão principal. É a chance de ver de perto os times da capital. E vou brigar com quem é contra essa idéia, porque não quero ver o meu time morto, porque se não houver os Estaduais, vários times vão desaparecer."

Foto: reprodução site ESPN Brasil

16/10/2009

resenha

O DVD do Romário
















Comprei. Assisti. A exemplo do filme Pelé Eterno, está longe de estar à altura do personagem em questão, mas vale como documento, ficará bem guardado para relembrar tanto talento daqui alguns anos. O DVD Romário É Gol (Olhar Carioca Filmes, direção de Sidnei Loureiro Jr) reúne mais de 850 gols da carreira de Romário, divididos em blocos pelos clubes em que atuou (Valencia-ESP, Miami-EUS, Sydney-AUS e jogos festivos reunidos em 'Outros'). O preço é acessível (paguei R$ 12,90 no Submarino, fora o frete), mas a divulgação tem sido pequena.

Como eu prefiro ouvir a má notícia antes da boa, vamos, primeiro, aos pontos negativos do DVD:
• parece que os gols foram tirados do You Tube, pois a qualidade da imagem da grande maioria deles é muito ruim. Chega a ser tosco 'embaçar' os selos do Sportv no canto da tela.

• a apresentação dos gols fica por conta do filho, Romarinho, e até me surpreendeu, pensei que seria pior. Mas ganharia muito mais credibilidade e dinamismo se feita por alguém do ramo.
• a ideia de trazer convidados (Eri Johnson, Gabriel Pensador, Evandro Mesquita) foi ótima, os caras mandaram bem, mas o texto era fraquinho...

Pontos positivos:

• a participação do parceiro Bebeto, de uma postura sensacional em mostrar seu carinho a Romário, enaltecer seu talento, mas sem esquecer de citar suas próprias virtudes na dupla. Faltou a sensibilidade dos idealizadores de filmar um bate-papo dos dois, finalizado por um abraço.
• apesar da má qualidade das imagens, a pesquisa impressiona pela quantidade de gols na passagem pelo futebol holandês.
• interessantes as intervenções de arte digital sobre os 11 gols preferidos do craque.
• e, claro, quando o Baixinho abre a boca, não tem pra ninguém! Língua afiada, rancor com Parreira e Zagallo, revelações de bastidores e a marra de sempre.

É interessante constatar as diferentes fases do goleador:

• o início no Vasco foi de um Romário veloz, vários gols em arrancadas, driblando o goleiro e já naquela época os biquinhos no canto esquerdo do goleiro.

• na Holanda, deitou e rolou em zagueiros duros, além de abusar do oportunismo dentro da pequena área. Lá, batia pênaltis também.
• no Barcelona, a arte em pessoa. Gols de quem pensa rápido. Finalizações de primeira, chutes por cobertura surpreendendo goleiros, sempre colocado na cara do gol por Laudrup ou Stoichkov.
• no Flamengo, voltou a cobrar (muitos) pênaltis e se consagrou nas fracas defesas dos clubes cariocas. Mas, não deixou de balançar as redes contra os grandes, principalmente sobre seu rival preferido, o Corinthians. Teve lampejos de velocidade.
• a partir do retorno ao Vasco, em 2000, apurou o posicionamento na grande área, para compensar a menor explosão. Preferiu esperar a bola a ir de encontro a ela. Mas sabia exatamente onde ela viria...

Romário tem razão. Papai do Céu olhou pra ele e disse: 'Você é o cara!'. Só esqueceu de completar '... na grande área'.

Imagens: reprodução

15/10/2009

entrevista: tostão

Esta entrevista que fiz com o craque Tostão saiu na edição 8 da revista Gol FC. O cronista fala de de futebol com clareza, quase que de forma didática, para não dar brecha a interpretações equivocadas sobre o que pensa. Vale a pena conferir.



TOSTÃO
O cronista mais admirado do país fala com a coerência e a sinceridade que o caracterizam desde os tempos de jogador

Por Fernando BH

A fala é mansa e o sotaque mineiro, inconfundível. Na conversa por telefone com Gol FC, nenhum barulho ao fundo. A serenidade é mesmo a marca de Tostão. Colunista de grandes jornais brasileiros, o doutor Eduardo Gonçalves de Andrade, 62 anos, diagnostica como poucos o nosso futebol. E, apesar de não gostar muito, também fala um pouco de sua gloriosa (e por vezes dramática) trajetória. Desnecessário desejar boa leitura quando o craque da palavra está em campo.

Por que você critica a importância que se dá hoje aos técnicos?
Que fique bem claro que eu os acho importantes, só que a imprensa supervaloriza. Uma substituição qualquer é responsável pela vitória do time. Às vezes a troca foi errada, mas o time acabou ganhando e dizem que foi mérito do treinador. A mesma coisa o contrário, quando perde e ele substitui bem. O futebol tem tantos detalhes para o pessoal se concentrar tanto no técnico... “O time do fulano”! Há um exagero na relação de imprensa e torcedor com o técnico.

O papel do manager não agrada a diretoria do São Paulo. Será difícil vermos Vanderlei Luxemburgo dirigindo o Tricolor?
Essa é uma grande qualidade do São Paulo. Um dos motivos de estar à frente dos outros. Lá, o técnico é somente técnico. Apesar de a imprensa continuar dizendo que ganha por causa do Muricy... Claro ele é bom, eficiente, conhece futebol, é sério, sabe organizar um time. Mas são coisas que todo bom técnico deveria fazer. O que não pode é achar que ganhou um jogo só porque mudou o Richarlyson dois metros pra esquerda ou pra direita.

E o que é aquela rispidez com a imprensa?
Ele não tem paciência de ficar respondendo a muitas perguntas sem sentido. Há outras que não responde porque acha que técnico não tem que dar explicações à imprensa. Aí, vai para as entrevistas mal-humorado. Dá a impressão de que não queria estar ali e tem um comportamento às vezes mal educado e agressivo. Mas há um pouco de extremismo nisso. Não é só o Muricy. Cada um tem seu estilo, mas eu noto que todos os técnicos, com algumas exceções, acham que não têm obrigação de dar explicações. Eles acham o nível das perguntas de alguns repórteres da cobertura diária ruim. Algumas vezes, eles têm razão.

Como seria o Tostão técnico?
Seria mais democrático, tentaria cativar as pessoas com a troca de informações e opiniões. Não gosto do personalismo, do extremismo, o fato de ser o grande chefe, todos obedecendo, o que é comum no Brasil. Muitos ex-jogadores não conseguem ser bons técnicos porque não conseguem passar de uma função para a outra. O Renato Gaúcho continua agindo como se fosse a estrela que era como jogador. Se eu fosse técnico, eu ia querer assistir lá de cima. Na primeira derrota do time, iriam falar que faltou comando lá embaixo (risos).

E o Dunga? Você já sugeriu que ele se demitisse...
Ele não deveria ter sido escolhido, por não ter experiência como técnico. Mas os resultados dele são bons e qualquer pessoa que entenda futebol pode ter bons resultados. Basta que seja uma pessoa bem informada. O Maradona, por exemplo. Todos o achavam a última pessoa capaz de ser treinador de futebol. Vi a Argentina jogar e o time é organizado em campo. O Dunga sabe como colocar um time em campo, é o que todo técnico deve saber. O fato de o Dunga ter resultados iguais aos que teria Parreira, Luxemburgo ou Muricy mostra que, mesmo que seja um técnico que não entenda nada de futebol, qualquer um que entrar ali vai ter o mesmo aproveitamento médio. O mais importante não é o técnico, ele é uma parte. O Brasil pode ser campeão do mundo com o Dunga. Mas quero enfatizar que não é a presença do técnico que vai fazer ganhar ou perder.

No caso do Maradona, a admiração dos jogadores argentinos pelo mito influencia em campo?
Pode ajudar, mas não sei dimensionar. Os jogadores o admiram, querem vê-lo bem, mas se a Argentina tiver sucesso, não vou achar que essa é a principal razão.

Por que o Pelé não é tão amado pelos brasileiros como o Maradona é pelos argentinos?
O Maradona encarna o que é o ser humano. Ele se expõe, mostra suas fraquezas. O Pelé é uma boa pessoa, claro, mas passou a vida toda querendo mostrar o que não é. E as pessoas percebem isso. Todos o reconhecem como maior jogador de todos os tempos, mas não têm muita admiração pela sua figura. O Pelé gosta muito de fazer média. Vai à Itália, faz média. Vai à França, faz média. No Brasil, fala outra coisa. O Maradona pode falar besteira, mas fala a mesma coisa em qualquer lugar do mundo.

Já virou lugar comum dizerem que o nível do futebol praticado no Brasil é baixo. Você concorda?
Pela saída de tantos jogadores e pelo fato de que os da Seleção, com raras exceções, estão na Europa, os jogos no Brasil são surpreendentemente bons. Bem disputados, emocionantes, os times taticamente organizados. Há um pouco de erro na comparação com a Europa. Fora uns oito times, os que sobram não são melhores do que os brasileiros. No Brasil, não há jogadores como Kaká, Xavi, Pirlo, Messi, mas há jogadores atuando aqui melhores do que muitos que estão em grandes clubes europeus. Acham tudo uma maravilha na Europa, e não é. É evidente que os melhores estão lá, mas quando se convoca uma Seleção e são chamados apenas um ou dois que atuam aqui, há mais uns quatro ou cinco no mesmo nível dos convocados da Europa. Por exemplo, temos vários goleiros aqui melhores do que o Doni.

O calendário do futebol brasileiro melhorou nos últimos anos. O que falta ser organizado nesse sentido para fortalecer os clubes?
Na verdade, melhorou porque estava um caos, um absurdo. A própria CBF chegou à conclusão de que teria que fazer alguma coisa, pois, mesmo com seus amigos políticos, Ricardo Teixeira não iria se manter no poder. Falta melhorar a estrutura dos estádios sem conforto, com gramados ruins, há a venda de ingressos desorganizada... A Copa do Brasil ser jogada pelos times que atuam na Libertadores e não se fazer Estaduais absurdos, com 20 times.

Mas acabar com os Estaduais não decretaria o fim dos pequenos clubes do Interior do país?
Os Estaduais não devem acabar, apenas serem mais curtos. Os clubes do Interior podem jogar em até cinco divisões do Campeonato Brasileiro. Os que tiverem competência e forem organizados vão subindo. E a Copa do Brasil pode passar para 128 times, aumentado apenas duas datas, incluindo mais uma fase entre os pequenos. Pode-se chegar a mil clubes! Não precisa aumentar o número de jogos dos grandes, apenas incluir fases preliminares entre os pequenos. Não há segredo nenhum.

Qual sua posição em relação à Copa de 2014?
Eu quero ver uma Copa do Mundo no Brasil desde que o dinheiro público seja gasto para trazer benefícios posteriores para a população. Que as melhorias sejam preservadas e não se invista dinheiro público reservado para assuntos mais urgentes. Assim, seria ótimo ter uma Copa. O penoso é que acontecem muitas coisas políticas, desperdício de dinheiro, como houve no Pan 2007. Disseram que o Pan era para o bem público, gastaram uma fortuna, mas não melhorou em nada a estrutura do Rio.

Com a África do Sul correndo contra o tempo e a incógnita brasileira, será difícil chegar ao nível da Alemanha 2006?
Não temos obrigação de fazer uma Copa moderna. É como uma pessoa sem recursos financeiros dar uma grande festa para impressionar. O Brasil tem que fazer uma coisa organizada, mas que não haja nada tão exuberante. E é um mito esse rigor da Fifa, de que tudo é perfeito. Na Alemanha, cansei de ver coisas que, se fossem no Brasil, todos iriam criticar. Estádios com problemas, centros de imprensa mal aparelhados. Em dois jogos da Seleção em Dortmund, havia jornalistas sentados no chão.

Quando você decidiu ser profissional, foi por perceber que seria diferenciado. Hoje, muito garoto acha que é diferenciado e não é...
É natural verem no futebol a chance de crescer na vida. Mesmo não tendo muito talento, o garoto acha que pode ganhar dinheiro e destaque. Se ilude com elogios antes da hora. Quando o Denílson estava prestes a ir para a Europa, eu o entrevistei. Ele disse que em pouco tempo seria o melhor jogador do mundo. Aí perguntei: ‘Mas você não acha que precisa aprender a cruzar melhor?’. Ele disse sim. ‘Chutar melhor?’. Sim. Outras perguntas, ele concordando. ‘Realmente, tenho que melhorar muito!’. Ele tinha uma habilidade extraordinária, mas não tinha vários fundamentos técnicos para ser um fora de série.

O Robinho vive falando que quer ser o melhor do mundo...
Se o Robinho tivesse consciência crítica de suas limitações, teria avançado mais. Ele é inteligente, muito melhor jogador do que o Denílson, nem se compara. Ainda tem uma grande chance de disputar o prêmio de melhor do mundo. Já o Kaká tem senso crítico, é um jogador que batalhou pelo que precisava melhorar, foi crescendo. Ele é uma exceção.

O que você espera do Ronaldo no Corinthians? (pergunta atual à época)
A expectativa é que ele jogue o que jogou no Milan, isto é, atuar de vez em quando e ter alguns momentos do grande Ronaldo que foi. Mas não dá para esperar dele regularidade, fazer muitos jogos no auge.

E, agora, mais perto da área.
Sim, em espaços mais curtos. O Romário se adaptou a isso, até não sair mais da área, tanto que jogou até os 40. Os mais jovens acham que o Romário foi sempre um centroavante. Ele era um espetáculo do meio para a frente. Tabelava, driblava.

Certa vez você disse que, na Copa de 1970, cederia sua camisa ao Romário...
Naquela posição de centroavante ele foi melhor do que eu. Não é falsa modéstia, é consciência. Ele foi o maior do mundo naquela posição. Ele e o Ronaldo.

A afirmação serve para o Fenômeno também?
Sim. Serve também para o Reinaldo, o Coutinho, o Careca... Todos centroavantes melhores do que eu, porque eu era mais meia do que atacante. Fazia muitos gols também. Mas meu forte era o passe. Jogava como joga hoje o Alex, como o jogou o Zico.

E o Zico foi melhor do que o Zidane, como foi recentemente eleito em uma enquete na TV?
Não acho, não. Zidane jogou mais. Eu até achava que o Ronaldinho Gaúcho iria se tornar melhor do que ele, pelo que jogou em dois anos no Barcelona. Mas o Zidane jogou muito durante dez, 15 anos. Eu vi Cruyff jogar, Platini, Zico, todos extraordinários. Mas, depois de Pelé e Maradona – e Garrincha, que é um caso à parte – o Zidane foi o melhor. Alguém pode dizer que o Zico foi mais objetivo, fez mais gols. Mas é cada um na sua função. O Zidane, como meio-campista, foi eficiente, fabuloso.

Na sua autobiografia, você afirma que a vida é curta e há necessidade de viver outras vidas (além de jogador, estudou e exerceu a medicina e hoje é cronista). Tostão tem mais algum sonho?
Dentro da minha vida, sempre desejo fazer coisas diferentes. Mas mudar de profissão, não tenho nenhum plano. De vez em quando recebo convites para voltar à TV, mas, por enquanto, estou tranquilo. Não sou de ficar correndo, fazendo muita coisa ao mesmo tempo. Prefiro fazer menos coisas e me dedicar mais a elas.

MAIS:

- O OLHO ESQUERDO
Como médico e observando os avanços da medicina, em relação ao problema que o tirou do futebol (descolamento da retina): se fosse hoje, você teria sobrevida no esporte?
Teria mais chances. As técnicas cirúrgicas são bem diferentes de 40 anos atrás.

Além do risco de sofrer nova lesão no olho, o que o impedia de jogar?
Eu perdi parte da visão do olho esquerdo. Para minha vida normal, não me atrapalha. Mas, como atleta, precisava dos dois olhos trabalhando juntos. O atleta precisa estar atento a certos detalhes. Se eu tivesse continuado, mesmo se eu quisesse, não seria o mesmo jogador, teria dificuldades, como tempo de bola. Eu não sentiria segurança.

- CRUZEIRO
Você saiu de forma conturbada do Cruzeiro, quando abriu mão dos 15% a que tinha direito. Qual sua relação, hoje, como clube e com a torcida?
Com o clube, nenhuma. E faço questão de não ter, pela minha função de cronista. Preciso ter toda a liberdade. Tenho que manter total independência. Alguns compreendem, outros não. Convidavam-me muito para eventos do Cruzeiro. Nem me chamam mais, porque sabem que não vou. Com a torcida a relação é muito boa. Me surpreendo até hoje. Onde vou, o torcedor cruzeirense me trata com carinho.

- CENTROAVANTE ARMADOR
Você impressionou em 1970 como “centroavante armador”. Como chegou a essa função?
Eu me inspirei no Evaldo, meu companheiro no Cruzeiro. Eu jogava mais atrás e o Evaldo era fora de série atuando como pivô. Quando joguei nas Eliminatórias, com o João Saldanha, eu jogava como no Cruzeiro. Já o Zagallo queria um centroavante mais próximo da área. Quando ele assumiu a Seleção, disse que eu seria reserva do Pelé, pois não imaginava que eu poderia jogar de centroavante. Não me esqueço o dia em que ele resolveu me colocar. Experimentou outros centroavantes que não foram bem – o Roberto e o Dario – e resolveu me testar. ‘Dá pra você jogar nessa posição? Não quero que fique recuando muito’. Eu disse: ‘Perfeitamente. Vou jogar como o Evaldo joga’. Individualmente, não era a posição que eu poderia render mais, mas para a Seleção foi importante.